segunda-feira, janeiro 19, 2009

KAKÁ E UM MUNDO
QUE ESTÁ MALUCO

Antes de mais nada, que fique claro: nada tenho contra o Kaká e tomara que ele possa ser sempre cada vez mais bem remunerado pelo seu trabalho e tenha muito sucesso. O que vou escrever é uma análise particular, uma visão de mundo tendo como pano de fundo essa absurda proposta do Manchester City pelo craque brasileiro.
Vivemos em um mundo absurdamente desigual e com uma economia, um sistema de vida, que ruiu. Baseado em riquezas inexistentes, fortunas virtuais e um desejo sem precedentes pelo fausto, pelo luxo, pelo inútil, em última análise. Mas há também o que eu chamo de boa economia, do mundo decente dos negócios, de gente que investe querendo ter lucro - o que é um direito sagrado - mas que produz algo, acrescenta, movimenta o mundo.
Fico pensando no que motiva alguém a oferecer R$ 360 milhões por um jogador de futebol. R$ 3,5 milhões por mês, leio no Globo Esporte. A conta não fecha nunca. Ou é prejuízo na certa ou é lavagem de dinheiro.
Eu penso o seguinte: nenhum ser humano merece ganhar R$ 3,5 milhões por mês de salário. É um acinte. Ninguém é assim tão importante que justifique uma brutal diferença em relação aos outros. Seja em qualquer ramo de atividade. Assim cria-se monstros. Como disse o grande amigo Léo Júnior, no Gama, quando trabalhando juntos em Goiás x São Paulo: maior do que a instituição, só houve um: Pelé.
Esporte é legal, bacana, mas é apenas esporte. Num mundo em que a estupidez suprema da guerra ainda acontece e no qual populações são dizimadas pela fome e pelo ódio étnico na África, um sujeito que tem dinheiro aos borbotões deveria fazer melhor uso do mesmo. Esse sheik que aposta essa fortuna no Kaká poderia, sim, apostar algo no craque, mas dentro de um valor que, mesmo sendo alto, fosse normal.
Posso estar ultrapassado, fora da ordem mundial, mas esse lance todo do Kaká só prova que o futebol é uma ilha de loucuras num mundo sem rumo. Um esporte fantástico, apaixonante, mas que opera no vermelho, troca barulho por dívidas e transforma gente com currículo pra lá de suspeito em donos de instituições esportivas centenárias.
Prefiro o futebol do jogo Brasil x Haiti, dos amigos do Zidane contra os amigos do Ronaldo, do craque que levantou a camisa em favor da Palestina. O esporte mais popular do mundo tem todo o direito de enriquecer e levar riqueza a seus maiores astros. Só não pode ofender ao ponto em que está chegando. A bolha pode estourar e levar junto o próprio jogo.

4 comentários:

Robert Alvarez Fernández disse...

Caro Maurício, não há como discordar de seu texto....colocando um pouco mais de pimenta para tornar a questão mais indigesta, se me permite.

O Manchester City tem média de ocupação de seu estádio de aproximados 91%, dados frescos e já desta temporada. Mesmo que a presença do Kaká encha o estádio a capacidade de geração de receita não passa dos 10% além do que já arrecada em bilheteria, o que seria algo como 2,3 milhões de libras em 19 jogos (temporada cheia).
Além disso vamos assumir que um milhão de pessoas vai comprar a camisa do Kaká no período de um ano...a 20 libras de lucro bruto por camisa, seriam 20 milhões de libras/ano (a grande Manchester tem 3.5 milhões de habitantes).
Já estamos falando de 22,3 milhões de libras/ano, descontando alguns custos operacionais, bem grosso modo, seriam vinte milhões de libras/ano para o clube, ou 70 milhões de reais.
Claro que com classificação para Copa da UEFA ou Champions vem uma boa grana extra de TV, mas não creio que este investimento demore menos de cinco anos para retornar...o que significa que o Kaká, neste tempo, não pode ficar nem gripado.
Muito risco, meu bom amigo, que só os irresponsáveis ou os que estão com a vidinha muito boa correm.
Enquanto isso, metade do mundo padece, como diz você e a canção "Half the World" do Rush (minha banda favorita).

Abraços,

Robert

Anônimo disse...

Noriega, parabéns pela análise. Os árabes em geral tem essa necessidade em aparecer na mídia pelo lado do dinheiro. Deveriam melhorar a infra-estrutura do país (UAE) que é muito parecida com a a brasileira. Falta transporte público, moradia, respeito, entre outras coisas. Dinheiro não compra inteligência, nem humildade.
Sobre o clubes europeus ainda tem gente que ACHA que eles são infinitamente melhores e mais ricos do que os clubes brasileiros. O que esses gringos devem para bancos e governos de seus países não dá nem pra comparar...Só para lembrar também que o presidente do Real Madrid está em baixa, que o futebol Frances acabou, que na Inglaterra os grandes clubes possuem "donos", e por aí vai...
Uma hipocrisia só.

Norival Leme Jr disse...

Não há dúvida, um absurdo! De qualquer modo o sheik ainda, de quebra, produziu uma baita publicidade gratuita para o City. Mesmo com contratos de imagem custeando o salário do nosso ex-tricolor, também acho que a conta não fecha.
Bola dentro do Kaká ao ficar. Em gesto de renuncia maior, deveria voltar o tricolor!....rs
Abraço!
Nori

Anônimo disse...

Excelente análise, assino embaixo. Fico me perguntando quando esta bolha vai estourar e quais serão as primeiras vítimas. Não nos esqueçamos que a Europa inspira menos otimismo que os EUA em meio a toda esta crise.