quinta-feira, abril 26, 2012


Altitude e baixaria



Entre os muitos temas polêmicos do esporte, a questão da prática em cidades situadas em locais de grande altitude é das mais complicadas.

Já me manifestei aqui anteriormente sobre isso. Repito a postagem aqui para refrescar a memória.

Sempre que alguma equipe brasileira disputa alguma partida de futebol em La Paz (ou em Cuzco, Potosí) volta-se a debater essa questão.

Não tenho conhecimento científico para levar o debate a esse lado. Jamais estive em La Paz para testemunhar algo sobre as reações de meu organismo. Ouvi relatos de amigos que impressionaram pelas dificuldades, com desmaios, dores de cabeça etc. Também sei de histórias de outros amigos que nada sentiram.

Conheço pesquisas de médicos bolivianos que apontam para uma defesa do direito de se jogar na altitude, enumerando motivos e argumentos. Também há trabalhos de cientistas brasileiros que citam riscos e prejuízos à saúde dos atletas.

Um resumo do que penso: um dos motivos para a popularidade do futebol é sua universalização. Como proibir alguém de jogar futebol, de montar um time e construir um estádio em grandes altitudes? La Paz é a capital da Bolívia. A Cidade do México está ali desde os tempos dos astecas. No caso da capital boliviana, até as operações de pouso e decolagem de aviões são de muito risco, cheias de detalhes técnicos. Mas é preciso chegar e partir dali voando.

Não sou arrogante ao ponto de afirmar que tenho a solução, mas talvez fosse o caso de se estudar o calendário das equipes que jogam nas alturas. Oferecer ao adversário, dentro do regulamento, mais tempo de adaptação. Vão dizer que é impossível, que não há datas etc. Virem-se. Os dirigentes estão aí para isso. As federações e confederações faturam os tubos para isso. Os clubes também possuem recursos para aplicar nessa questão. Uma opção seria dar ao time que atuará em La Paz e Potosí uma semana livre para jogar apenas essa partida, um período de sete dias.

Com suas particularidades e diferenças, também oferece riscos à saúde de um atleta profissional uma partida as 15 horas em pleno verão carioca. Ou nordestino. Também no interior paulista. E, ainda que de forma atenuada, um jogador que vive e treina em La Paz, se tiver que descer o morro e jogar em Manaus, por exemplo, terá um prejuízo atlético já explicado pela ciência.

Mas é um tema cabeludo. Só acho que não se pode simplesmente negar o direito de se fazer e jogar futebol a quem vive em grandes altitudes.

O que se pode e se precisa fazer, urgentemente, é acabar com a baixaria dentro e fora de campo em muitas partidas da Libertadores da América. O mais nobre e importante torneio do futebol sul-americano não pode ser submetido a cenas lamentáveis como atletas recebendo pedradas, como aconteceu ontem com Neymar. Ou então casos que todos já vimos em partidas na Colômbia, quando para cobrar um escanteio o jogador precisa ser protegido por escudos de policiais, tamanha a quantidade de objetos que são atirados contra ele.

A pressão em partidas realizadas em estádios de clubes pequenos e médios da Argentina é surreal. Gândulas atuam como guerrilheiros, torcedores têm fácil acesso a vestiários e, até mesmo, ao gramado. É preciso, sim, aprender com a Uefa e o padrão de excelência que ela dá à organização de seus torneios continentais.

Dentro de campo também. O que Neymar apanhou ontem em La Paz foi escandaloso. A violência é legitimada por alguns árbitros sul-americanos. Também pelo fato de a Conmebol aplicar apenas multa em dinheiro para os cartões amarelos. O que transforma a punição em um excelente investimento para a entidade, que só lucra com as canelas dos jogadores.

Basta comparar o número de faltas em um jogo da Libertadores com uma partida da Champions League. Dá vergonha. Algumas estatísticas por aqui beiram a selvageria.

Por falar em Champions League, lá vai o Bayern para outra decisão. O jogo contra o Real Madri foi muito melhor de assistir do que a semifinal entre Barcelona e Chelsea. A equipe alemã é fortíssima, organizada e muito segura mentalmente. Tem um currículo invejável na Champions, mas não goza do prestígio com a mída que Barça e Real têm. Fora isso, o futebol alemão segue sendo apontado por muita gente como um estilo mecânico e sem sal. Discordo. A bola alemã está cheinha. Muitos bons jogadores, toque de bola, padrão tático bem definido. É uma escola que merece muito respeito.  

quarta-feira, abril 25, 2012


 

Os números falam?



Para os amantes das estatísticas (não sou um deles), alguns dados dos números oficiais da Uefa sobre o duelo entre Chelsea e Barcelona, em 180 minutos.

O Barcelona teve 36 finalizações em dois jogos, sendo que 11 delas "no alvo" como diz a nomenclatura oficial, e 25 fora do alvo. O Chelsea teve 11 finalizações em 180 minutos, sendo 4 no alvo (na direção do gol).

O time inglês cedeu 18 escanteios à equipe espanhola. Os azuis tiveram dois escanteios a seu favor em 180 minutos.

O Chelsea cometeu 21 faltas em duas partidas, o Barcelona fez 17 (números para fazer morrer de inveja o torcedor brasileiro, que vê uma cavalaria desenfreada nos jogos daqui).

Foram oito cartões amarelos e um vermelho para o Chelsea, e dois amarelos para o Barcelona.

Para os defensores do "marcar bem"  refletirem.

O treinador do Chelsea, Di Mateo, resumiu bem, para o meu olhar de analista, o que foi o jogo.

"O segundo tempo foi muito mais paixão e desejo do que tática".

terça-feira, abril 24, 2012

 

Porque isso é futebol



Deu Chelsea contra o Barcelona. Foi a vitória do bico pro mato que o jogo é de campeonato sobre o futebol de toques envolventes, de posse de bola e o dobro, às vezes o triplo de finalizações que o advesário.

Foi uma classificação limpa, justa, sem contestações no campo esportivo.

Dessas que ajudam a fazer do futebol o esporte mais popular do planeta, talvez o único que possibilite ao pior vencer o melhor com alguma frequência. Muito mais do que qualquer outra modalidade individual ou coletiva.

Gosto não se discute. Em alguns casos se lamenta. Mas sempre se respeita.

Sigo achando o Barcelona uma dádiva dos deuses do futebol. Um time que, povoado de baixinhos habilidosos, ousou colocar na roda uma penca de adversários cheios de superatletas fortes como touros. Subjugou quase todos os principais times do mundo, sejam eles da Europa ou da América do Sul.

Provou ser possível jogar com a bola, em torno dela e por causa dela. Não apenas se livrando da mesma.

O estilo do Chelsea não me agrada.

Não acho nem que seja um time que marca bem. Sofreu duas dezenas de finalizações em duas partidas seguidas, teve bolas na trave, tomou dois gols em linhas de passe dentro de sua área. Isso não é marcar bem.

Agora, foi um time raçudo, que encarou sua limitação e soube se entrincheira em frente à sua área. E, tirando Terry, que é muito mais um arruaceiro do que um jogador de futebol, jogou na bola. Duro, sem apelar para a violência, dentro das regras e da lei do jogo. Conseguiu uma classificação com méritos.

Mas eu jamais pagaria ingresso ou pararia em frente à TV para ver um jogo do Chelsea (a não ser esse contra o Barça e uma final de liga européia). Como time não me atrai em nada. Como instituição, seu dono me causa repulsa.

Sou um admirador do futebol equilibrado. Dos esportes equilibrados, equipes que saibam atacar e se defender, mas que fundamentalmente, tenham na busca pelo resultado, no que se convencionou chamar de escore. Admiro um belo bloqueio, mas tendo a ficar com a finta que possibilita a um atacante mais baixo enganar uma muralha. Ou ao armador pequenino que infiltra em uma defesa de gigantescos pivôs da NBA.

Mas é gosto. Não compraria um disco de axé, mas tem quem compra e goste. Eu fico com meu bom e velho rock, um pop de boa qualidade.

Se uma rádio me oferece Luan Santana, eu me reservo o direito de colocar um CD do Genesis.

Em resumo, sucesso e vitórias muitas vezes são merecidos, ainda que não primem pela qualidade.

Aos que afirmam admirar uma bela defesa, eu também gosto. Mas prefiro as do Milan com o Arrigo Sacchi e o Fabio Capello. Ou, para ficar no nosso campo histórico nacional, zagas como as do Inter dos anos 70 ou mesmo um trio eficientíssimo de beques como o do São Paulo tricampeão brasileiro, ou qualquer dupla que tivesse um Gamarra ou um Luís Pereira, um Darío Pereyra, um Marinho Peres, um Figueroa. Ou a Academia palmeirense de Oswaldo Brandão, que fazia um a zero e ficava tocando a bola, dava pro Ademir da Guia e se contentava com um, dois gols, porque sabia que lá atrás tava garantido.

São estilos.

Só me reservo o direto de jamais aceitar o argumento de que o que vale é taça no armário, que é preferível vencer jogando mal do que empatar ou perder jogando bem. Sabe por quê? Porque é exceção. A regra é que em 99% das vezes quem joga melhor vence. Os que jogam melhor deixam lições e legados. Os que jogam melhor também perdem, mas ganham muito mais.

Felizmente, no futebol tem o dia do pior ganhando do melhor. Porque essa é uma das muitas graças desse jogo que pode parecer demoníaco, mas no fundo é divino.

segunda-feira, abril 23, 2012


Campinas, Rio, Minas, Sul...













Impossível não lembrar dessa foto aí acima no dia de ontem. Remete aos tempos em que a revista Placar vivia tempos realmente relevantes, e o futebol de Campinas estava no seu auge. Os anos 1970, especificamente.

As classificações de Guarani e Ponte para a semifinal do Paulistão foram irretocáveis, merecidas, incontestáveis. E remetem a esse tempo em que ganhar de Bugre e Macaca na Cidade das Andorinhas era praticamente impossível.

Havia constelações jogando no Brinco e no Moisés. Zenon, Careca, Zé Carlos e Renato de um lado. Oscar, Polozzi, Carlos e Odirlei de outro. A Placar sabiamente uniu aqueles craques com a cidade de Campinas ao fundo e escalou uma equipe que certamente formaria um esquadrão.

Num campeonato marcado por arbitragens de quinta categoria, um regulamento estúpido e jogos previsíveis, Ponte e Guarani garantiram a dose de surpresa necessária para espantar a mesmice. Um dos jogos decisivos será em Campinas, e é bom Santos e São Paulo não bobearem contra quem passar do histórico dérbi da próxima semana.


Alvinegros no Rio


Desde a temporada passada que o Vasco vem jogando o futebol mais consistente e agradável entre os grandes do Rio. Tem seus altos e baixos, mas quando está completo é um time muito interessante.

O Botafogo pode não ser brilhante, mas também tem um jeito de jogar, atletas de bom nível, repôs jogadores com características parecidas às daqueles que lá estavam. Farão uma bela final de Taça Guanabara e certamente torcerão para que o Flu se desgaste muito na Libertadores.

Gre-Nal fora de hora


Era para ser a final do Gauchão, mas será apenas da Taça Farroupilha. O Caxias se meteu entre os grandes gaúchos e atrapalhou a vida de ambos. Luxemburgo tenta se recuperar no Grêmio, enquanto o Inter tem a Libertadores no meio do caminho. Mas Gre-Nal sempre vale a pena e traz consequências. As feridas costumam demorar a cicatrizar.

Minas ferve


Cabeças quentes de sobra nas semifinais em Minas. Bate-boca entre jogadores do Coelho e da Raposa, dedo em riste entre jogadores do Tupi contra o Galo. Muita coisa ainda vai acontecer, sô! Espero que com mais calma. Mas ainda acho que vai dar Cruzeiro x Atlético na despedida das finais em Sete Lagoas.

E na Boa Terra a dupla Ba-Vi se deu mal na primeira perna das semifinais. Mas tem tudo para virar o jogo e decidir um torneio marcado por uma tempestade de gols. Porque a energia da Boa Terra merece.

E o que é melhor de tudo: o Brasileirão se aproxima.

quinta-feira, abril 12, 2012


Parabéns, Juninho Pernambucano!



Caro leitor, se você ainda não viu, veja, leia e preste muita atenção no desabafo feito por Juninho Pernambucano em entrevista a Vanessa Riche.

É um daqueles raros casos de bom senso e sinceridade que de vez em quando teimam em fugir ao lugar comum das declarações redundantes e vazias proferidas por 90% das pessoas que militam no futebol.

Juninho protesta, justamente, contra o vazamento dos valores de seu contrato com o Vasco.

Essa é uma das muitas manias de uma parcela de torcedores e de outra parcela da mídia no Brasil. Há uma obsessão por saber quanto ganham técnicos e jogadores de futebol. Tem gente que acha que vale matéria de capa e ainda bate tambor dizendo que fez uma grande reportagem, relevante.

O problema é que alguns acreditam que para resolver os problemas do Brasil é preciso começar pelo futebol, tamanha a virulência de alguns textos, comentários e atitudes. Se nossos políticos fossem cobrados com essa volúpia estaríamos hoje muito melhor como Nação.

Atleta profissional de futebol não é funcionário público, não prestou concurso, não prevarica em sua relação de empregado de uma entidade teoricamente sem fins lucrativos.

Assim como qualquer outro funcionário de qualquer empresa. Só porque é famoso, celebridade e enriqueceu graças ao seu trabalho ele precisa ter seu salário revelado? Onde está escrito isso em algum manual de redação decente?

Cada um pode achar relevante o que bem entende no exercício da sagrada profissão de jornalista, mas eu me reservo o direito de parabenizar o Juninho Pernambucano. O quanto ele ganha é problema dele e de quem paga a ele. De mais ninguém.

Se ele quiser falar quanto recebe, abrir os valores de sua relação trabalhista, problema dele.

Mas a regra nas relações entre clube e jogadores (e vice-versa) no Brasil ainda é movida a mesquinharia. Tem um tipo de dirigente que, quando o atleta entra em má fase, adora espalhar quanto ele ganha e falar do tal custo-benefício.

Assim como tem jogador que gosta de passar a notícia de que um recém-contratado chegou ganhando muito mais do que ele. Ciúme de homem é terrível e, no futebol, ganha proporções inimagináveis.

O jogador de futebol no Brasil vive sob a lupa de uma bem articulada rede de espiões. Torcedores que acham legal ser dedo-duro e fotografam atletas em suas horas de folga como se eles não pudessem fazer o que qualquer mortal faz na hora do descanso. Paparazzi, setoristas de celebridades e parentes e informantes de cartolas completam essa teia moralista e retrógrada. Gente que quando o time ganha curte a balada com o jogador, tira foto, tenta parasitar para ver se sobra alguma coisa no fim de noite. Se perde, sai vociferando teses de comprometimento, respeito, honra, caráter.

Uai, só porque não exerce uma atividade que pressupões preparo físico o sujeito pode encher a lata, dormir pouco e inventar uma desculpa pro chefe? Ele pode, o "boleiro" tem que ser um monge franciscano?

Façam-me o favor!

Vivemos num País que enfrenta uma autêntica guerra civil de violência urbana. Mata-se em saída de banco por quantias irrisórias. Quadrilhas montam arsenais para invadir lares em plena luz do dia. Qual o sentido de alardear como matéria útil dizer quanto recebe um jogador de futebol?

Honestamente, não vejo nenhum. Pouco me importa quanto recebe o craque, o perna-de-pau, a promessa. Nunca liguei pra isso. Talvez seja questão de índole.

Nesta semana, numa palestra com estudantes da Universidade São Judas Tadeu, me perguntaram o que eu achava da questão dos salários astronômicos de futebol.

Essa foi minha resposta: "Errado não é jogador de futebol ganhar bem, errado é professor ganhar pouco, bombeiro ganhar pouco, policial ganhar pouco e a população em geral ganhar pouco e ser mal atendida por quem ganha muito para trabalhar por ela".

Parabéns, Juninho, por se revoltar contra esses bisbilhoteiros!