terça-feira, outubro 29, 2013

Seleção não é Exército e Copa do Mundo não é guerra

Seleção não é Exército e Copa do Mundo não é guerra.

Diego Costa não será menos brasileiro por ter decidido atuar como atleta profissional por outro país.

Nenhum atleta é mais cidadão ou mais patriota por ter representado seu país. Foi o caminho que ele escolheu na vida e muitos ganham fortunas nesse caminho.

Existem atletas fantásticos que não são tão fantásticos como cidadãos. E existem cidadãos fantásticos anônimos.

Deco jogou futebol pela seleção portuguesa e como cidadão brasileiro tem um projeto social exemplar em Indaiatuba, o que o faz mais patriota do que se tivesse jogado uma Copa pelo Brasil.

É o que penso.

sexta-feira, outubro 25, 2013

A dor e a delícia de ser Rogério Ceni


Rogério Ceni é um cara que venceu na vida. Chegou ao topo de sua profissão, é ídolo, tem reconhecimento profissional e foi muito bem e justamente remunerado por isso. Vive o sonho de muita gente. Mas tenho certeza que não é uma existência apenas de sonhos e sorrisos. Acordar como Rogério Ceni não deve ser nada fácil para ele muitas vezes.

Não sou amigo do Rogério. Sempre tive um ótimo relacionamento profissional com ele, fui tratado com respeito. Até porque sempre o tratei dessa forma.

Ele é um ponto fora da curva no perfil do jogador de futebol padrão. É articulado, pensa, se posiciona. Isso incomoda muita gente. Outros jogadores, treinadores, torcedores, jornalistas e dirigentes.

Nem sempre compartilho das opiniões e posturas do Rogério. Mas o que acontece com ele em algumas situações é tremendamente injusto. Há momentos em que ele não é julgado como atleta, mas como uma espécie de entidade. Existe exagero naqueles que o mitificam cegamente, como também nos que relutam em reconhecer suas muitas qualidades como goleiro profissional.

A liderança do arqueiro são-paulino é mais pragmática do que carismática. Rogério remete ao Leão, não ao Taffarel, por exemplo.

Como goleiro me parece inquestionável. Está entre os melhores do País em qualquer lista que seja produzida. Tem um bônus que é a qualidade para bater na bola, fazer gols de falta e pênalti. Diria que numa análise técnica, comparando a um contemporâneo, Rogério não tenha vivido um período de exuberância como o de Marcos entre 99 e 2002. Mas mostrou mais regularidade e longevidade, por ter sofrido menos contusões.

Quando Rogério falha, muitos tripudiam. Inclusive são-paulinos que dele não gostam. Quando emplaca uma atuação de gala, como fez diante da Católica, algumas bocas venenosas parecem estar costuradas apenas para não fazer o elogio justo e merecido.

Vá lá que Rogério de vez em quando vista a camisa de preposto (aquele cara que vai a uma ação trabalhista apenas para dar a versão da empresa). Fala como se fosse diretor do São Paulo, joga para a torcida, se comporta como se estivesse na arquibancada do Morumbi, cutuca adversários. Conheço dirigentes do clube dele que odeiam essa postura e também temem que ele entre para a política interna da entidade. Ouvi de muitos jogadores que atuaram ou atuam com ele alguns dos apelidos que eles deram, mas não falam na frente do Rogério. Coisas como Presença, Presidente, Chefia, Primeiro-ministro.

O que acho injusto e sacana é ler nas redes sociais ou mesmo em opiniões abalizadas que o Rogério (isso vale para qualquer profissional) tem que se aposentar, que já deu, está na hora de parar. Sempre que alguém me pergunta sobre isso respondo que não sou do INSS para aposentar alguém. É de uma crueldade sem tamanho querer decretar que a história de alguém chegou ao fim. Pior é ler algumas vezes as mesmas pessoas, torcedores na maioria, endeusando o Rogério uma semana depois. Falta filtro, coerência, equilíbrio.

Não se pode misturar o atleta com o ser humano em uma análise puramente futebolística. Rogério tem seus pecados, como todos nós. Na segunda metade dos anos 90 houve aquela até hoje mal explicada história do fax que um amigo dele enviou com uma inexistente proposta de um time inglês. Pegou mal no clube, assim como a loja que vendia produtos dele no Morumbi, sem conhecimento da direção. Ele ficou afastado, quase foi vendido. Errou como todos nós já fizemos um dia. Mas conseguiu se posicionar como um ídolo, talvez o maior na história de um grande clube como o São Paulo. É muita coisa.

Rogério tem respostas diversas vezes arrogantes, provocativas. Em outras é desconcertante, porque, como escrevi antes, raciocina e verbaliza o pensamento. Em campo, tem o costume de jogar para a torcida, tentar empurrar o estádio contra a arbitragem, até para encobrir alguns erros individuais. É inteligente, catimbeiro, sabe ler o jogo como poucos. Sua liderança emana e contagia o time, assim como qualquer falha também contamina a equipe, em virtude do peso que tem. E pega muito, intimida o atacante adversário. 

A questão é que, como escreveu o colega Victor Guedes, não parece correto que os cenistas de plantão o considerem à prova de erros e os anti-cenistas tenham pudor em elogiá-lo quando ele merece.

Estou solidário ao Rogério. Acho sacanagem quando o aposentam precipitadamente e misturam julgamentos extra campo ao que ele produz com as luvas. Também acho sacanagem quando babacas de plantão utilizam imagens pirateadas ilegalmente na tentativa de constranger companheiros de imprensa, como fizeram com meu amigo e companheiro de transmissões Milton Leite. Que, registre-se, tem comportamento eticamente exemplar como profissional.

Como escreveu o Caetano antes de brincar de censor: "cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é". Como toda a fama, idolatria e fortuna, não deve ser nada fácil ser o Rogério Ceni em alguns dias. Como em muitos outros deve ser delicioso.

sexta-feira, outubro 18, 2013

O futebol brasileiro como ele é



Pipocam análises e questionamentos sobre a qualidade técnica do Brasileirão - Séries A e B.

Analiso de uma forma bem simples e direta, citando Nelson Rodrigues: vemos, analisamos e criticamos o futebol brasileiro como ele é. E atualmente é fraco, limitado tecnicamente, embora exista competitividade.

Explicações devem existir várias e cada um tem a sua. A questão do calendário é uma delas. A falta de uma pré-temporada adequada me parece a mais necessária das alterações. A quantidade de jogos disputadas no ano pode ser relativa. Há grandes equipes europeias que fazem 70 partidas em uma temporada.

Se formos puxar mais longe pela memória, o calendário brasileiro nos 50, 60 e 70 era um escândalo, e foi essa a época de ouro do futebol no País.

Claro que o mundo mudou, o jogo mudou, mas é preciso reconhecer que, tecnicamente, mudou para pior. Atualmente os jogadores correm muito mais e jogam muito menos. A dificuldade para uma dominada, uma virada de jogo, um chute de efeito, uma tabela e diretamente proporcional à capacidade respiratória, força, impulsão.

Há cada vez mais atletas e menos jogadores. O ideal seria que tivéssemos jogadores que fossem bons atletas.

Entendo e respeito todos os argumentos de que falta tempo para treinar, mas também falta qualidade de treinamento. Principalmente na base. Os jogadores chegam aos times de cima cada vez mais mal formados, com defeitos graves nos fundamentos básicos do futebol. Aprendem quase sempre a destruir com absoluta competência, mas sofrem horrores quando são chamados a criar, a pensar.

Quem quiser discutir seriamente o futebol brasileiro não pode deixar em branco esse tópico. Como diz o intelectual Toninho Neves, sempre antenado, no tempo em que diziam que os treinadores dormiam no banco mas havia craques às pencas, o Brasil ganhou três Copas do Mundo entre 1930 e 1970 (tirando o período da Segunda Guerra). Entre 1970 e 2010, na era de pranchetas e estrategistas, foram duas conquistas e muitas empacadas em quartas-de- final. No mínimo, faz pensar.

Por mais que o futebol tenha mudado, existem questões básicas, fundamentais, que não mudam nunca. O jogo é sucesso planetário porque é simples. Diferentemente do voleibol e do basquete, esportes nos quais é possível transformar um galalau desengonçado em grande jogador em alguns meses, no futebol isso é praticamente impossível. As técnicas aplicadas a cada jogo são muito distintas.

Formamos cada vez mais volantes combativos e corredores, e cada vez menos meias criativos e lançadores, ou pontas-de-lança dribladores e finalizadores.

Para isso também é preciso pensar com bom senso.

quarta-feira, outubro 09, 2013

A bola está com Minas, sô!


A não ser que ocorra um acidente de proporções cósmicas com o Cruzeiro, o time será o legítimo e indiscutível campeão brasileiro da temporada. O que configurará uma dobradinha mineira nos torneios mais importantes do futebol de clubes sul-americano. Galo na Libertadores e Raposa no Brasileirão.

A bola está com Minas. Sem chororô, sem reclamação de calendário, de tabela, de excursão os times mineiros.

Com a bola bem jogada, com times muito bem montados por Cuca e Marcelo Oliveira e uma característica comum: ofensividade. Cruzeiro e Atlético jogam atacando com quatro homens na maior parte do tempo. Um oásis nesses tempos de volantes botinudos, laterais com enormes dificuldades para cruzar uma bola e carência de meias armadores e finalizadores.

Os grandes rivais mineiros fizeram tudo isso mesmo sem contar com os maiores orçamentos do Páis, sem estar entre as cinco grandes torcidas de penetração nacional.

A política futebolística de hoje é a do leite com leite, deixando o café paulista na poeira.

Cuca já se firmou no grupo dos grandes treinadores ao colocar em seu currículo a Libertadores. Sabe montar times, dar coerência tática e tirar o melhor de seus jogadores. Tem um elenco de muita condição técnica, com jogadores experientes e boas revelações. Saiu Bernard, em termos de regularidade e talento o melhor do time, e o Galo segue seu diapasão.

Marcelo Oliveira tem perfil diferente. Parecia ser o eterno interino até resolver meter a cara na vida de quem ganha a vida no banco de reservas.

Mostrou-se um cara discreto, eficiente e um grande montador de times, mesmo sem contar com super estrelas.

Armou um Coritiba veloz, ofensivo e que bateu na trave da Copa do Brasil duas vezes.

Agora conseguiu fazer do Cruzeiro um time fiel às tradições do clube, que joga bem e bonito, tocando a bola, atacando, dominando o adversário. Mesmo sem grandes contratações, estrelas badaladíssimas. Dedé talvez tenha sido a aposta mais barulhenta. O corpo da equipe é muito bem distribuído, com uma série de jogadores que jamais foram unanimidades (Dagoberto, Tinga, Borges, Bruno Rodrigo) um atleta que com Marcelo joga o fino (Everton Ribeiro), um volante que vive o melhor momento da carreira (Nilton), boas revelações (Mayke, Lucas) e um grande goleiro.

O grito de gol no Brasil ecoa das Alterosas com o inconfundível sotaque mineiro.

sábado, outubro 05, 2013

Bom Senso é só para a elite?


Acompanho com interesse a formação do movimento Bom Senso Futebol Clube por parte de um grupo expressivo de jogadores de futebol.

Categoria geralmente alienada, a dos jogadores de futebol raramente se manifesta ou e posiciona no Brasil.

São poucos os exemplos de jogadores que tenham buscado algum posicionamento, casos de Sócrates, Casagrande, Afonsinho, Zé Roberto (da Máquina do Fluminense nos anos 70) e mais recentemente Paulo André, do Corinthians.

A manifestação padrão do jogador de futebol brasileiro é reclamar de atraso de salário.

Como atores principais do espetáculo, os atletas devem se manifestar e se posicionar. Além de buscarem, entre eles próprios, um comportamento mais ético e profissional, a fim de erradicar a imagem existente do boleiro inconsequente, malandro, mulherengo e maniqueísta.

Ainda vejo com certo ceticismo esse posicionamento do Bom Senso Futebol Clube, embora o receba com pensamento positivo.

É difícil saber se é um movimento nascido e criado por jogadores ou se existe algum dirigente por trás, pensando em capitalizar com o movimento.

Não podemos esquecer que estamos às portas da eleição para o comando da CBF.

A pergunta que faço nesse momento em que o Bom Senso F.C é um movimento cujo interesse principal envolve apenas as Séries A e B do Campeonato Brasileiro? Ou os times atuais da Série A e mais o Palmeiras, que estará nela em 2014?

Como ficam os atletas profissionais que são a maioria e perambulam pelos esburacados gramados das Séries C e D ou então de campeonatos regionais em troca de um salário-mínimo, quando muito?

Eles serão contemplados pelo movimento, estão sendo ouvidos e procurados para participar? Porque eles é que formam a massa do pé-de-obra (como diz o Mauro Beting) nacional. O verdadeiro futebol brasileiro é formado por esse tipo de jogador.

Considero fundamental que esse movimento demonstre interesse em ser abrangente e não apenas elitista.

Qual o posicionamento do Bom Senso em relação aos atletas que sobrevivem com o dinheiro ganho nos quatro ou cinco meses em que disputam um Paulistão, por exemplo? Porque esta também é uma realidade para o atleta profissional de futebol no Brasil.

Como abordar jogadores de times do Norte e do Nordeste que enfrentam severas dificuldades até para receber salários baixíssimos?

Qual o posicionamento em relação aos chamados empresários?

A preocupação com o que os atletas chamam de Fair Play financeiro envolve os ganhos muitas vezes abusivos deles próprios? Os pré-contratos assinados em segredo?

Quem alcançou o topo da carreira sabe como é a vida na base da pirâmide social do futebol. Passou por dificuldades, morou em alojamentos, tomou calote, caiu no conto de empresários e dirigentes picaretas.

Por isso aguardo pelo posicionamento do Bom Senso F.C sobre o mundo real do futebol, não apenas sobre a realidade de carros importados, programas de TV, mulheres espetaculares e viagens e hotéis de primeira categoria.

A bola rola para todo mundo, do rico ao pobre.