É ilegal, é imoral e
engorda a chatice
Confesso que não é um dos melhores momentos para ser comentarista de esportes, em especial de futebol. Porque o futebol está se superando na arte de ficar a cada dia mais chato. E todos nós que estamos envolvidos nesse jogo apaixonante temos nossa parcela de culpa. Jogadores, dirigentes, imprensa, árbitros e torcedores.
Estamos transformando algo que era lúdico em questão de vida ou morte, de discussão acadêmica de Direito, de diferença regional e cultural, de arrogância e complexo de inferioridade. Fala-se mais de arbitragens e tribunais do que de tática, técnica, habilidade, destreza. Promotores, auditores, diretores jurídicos, delegados de arbitragem, figuras que deveriam trafegar na periferia do esporte, hoje andam nas manchetes. Erro nosso, que damos manchete para isso, erro de quem provoca a manchete porque erra no aspecto moral e também no aspecto legal. Mas, principalmente, erro de quem acha que no futebol há uma ética, um código de comportamento que pode correr paralelamente aos códigos de ética da sociedade.
A arbitragem brasileira vive um momento péssimo. Fez uma renovação apressada, incoerente e vive bombardeada por imagens em alta definição, por jogadores malandros, por treinadores e dirigentes histéricos e por torcedores fanáticos. Acusa o golpe, apita acuada, pressionada, o que potencializa o despreparo de muitos árbitros.
Claro que a postagem remete ao jogo Inter e Palmeiras. Para resumir o que penso e não ficar mais do que merece esse tema de tribunais e apito, há um fato: um gol marcado com a mão. Não pode. Há uma suposição em cima de um fato: esse gol teria sido anulado com auxílio de uma pessoa que não fazia parte do quadro de arbitragem escalado para o jogo. Se a suposição for comprovada como fato, também não pode. O terceiro fato: só se anula um jogo com prova cabal de interferência externa ou manipulação de resultado. O que remete ao erro grosseiro ocorrido em 2005, coincidentemente envolvendo também o Internacional. Porque erro grosseiro? Porque não se produziram provas cabais de manipulação de resultado para que jogos fossem anulados. Não fui eu quem disse isso, foi Paulo Schmidt, procurador do Stjd. Está gravado nos arquivos do programa Arena SporTV. No campo legal, o Palmeiras tem direito de investigar se houve realmente essa interferência e tentar provar que ela realmente ocorreu.
Passo agora para a análise moral. Barcos está errado ao fazer um gol com a mão. Como estão errados todos os muitos jogadores que atuam no Brasil, brasileiros e estrangeiros, que simulam faltas, cavam pênaltis e coisas desse tipo. Como estão errados os treinadores que atuam no Brasil e se utilizam de artifícios que não estão na regra para tentar levar vantagem. Perguntam a cinegrafistas, repórteres, a assistentes técnicos e diretores que têm acesso às imagens do jogo se houve falta ou irregularidade e, munidos dessa informação, que é ilegal para efeitos do que acontece no campo de jogo, partem para o ataque covarde contra a arbitragem. Mas quando o erro é a favor de seu time, calam e, quando muito, falam no final da coletiva ou no dia seguinte. Tudo malandro de ocasião. Querem, sim, levar vantagem em tudo. Mas não assumem.
Certo está o Seedorf, que detonou essa malandragem do boleiro nacional.
Se algum repórter oferece informação para um treinador ou jogador, está errado. Repórter não trabalha para time ou para a arbitragem, trabalha para a empresa que paga seu salário e tem o dever de informar quem está vendo, ouvindo ou vai ler o jogo. Só isso.
Muita gente tem razão no episódio ocorrido no Beira-Rio. O Internacional é quem tem mais razão. Afinal, sofreu um gol ilegal e imoral, não poderia ser validado. Esse é o único fato 100% comprovado pelas imagens. Mas repito: imagem não apita jogo. Quem apita jogo são os seis árbitros que hoje estão em campo. O principal, os árbitros assistentes (bandeirinhas), os adicionais (que ficam atrás dos gols) e o quarto árbitro. Fora esses, quem se intromete na arbitragem não está fazendo Justiça, mas, sim, agindo como justiceiro.
Não posso ser leviano e afirmar o que realmente houve no Beira-Rio. Não estava lá, só tive acesso às imagens e aos depoimentos dos envolvidos. Mas algumas coisas podem ser tiradas da análise das imagens. O gol foi validado pelo árbitro principal e também pelo assistente e pelo adicional que estavam do lado do campo naquele momento defendido pelo Inter. As imagens são cristalinas quanto a isso.
Quem assume a anulação do gol é o quarto árbitro. O que causa estranheza é ter demorado mais de seis minutos para fazê-lo. Se realmente viu, porque demorou tanto tempo? Não se trata de duvidar, mas de perguntar para esclarecer, uma regra jornalística. Seis minutos não é muito tempo para quem tem certeza do que viu?
Lamentável o fato de o presidente da Comissão de Arbitragem, Aristeu Leonardo Tavares, até agora não ter convocado uma entrevista coletiva para falar sobre o fato e tentar elucidá-lo. Assim como é inacreditável que na súmula do jogo esteja declarado que nada de anormal ocorreu. Prefere o caminho mais fácil de atacar o jogador que cometeu o ato ilegal, mas não ataca os árbitros que cometem barbaridades a cada rodada.
Duvido que o jogo seja anulado, pela dificuldade em se encontrar uma prova cabal de interferência externa. Repito: o Inter tem razão nesse momento, no aspecto moral, e o Palmeiras pode ter razão, se conseguir provar, no aspecto legal.
Se evoluirmos, cada um dentro de sua área de atuação, para comportamentos mais éticos e restritos a nossas competências, poderemos contribuir para que eventos como esse não se repitam. O jogador não deve tentar enganar alguém, sob pena de ser enganado na rodada seguinte. Instrutor de arbitragem não pode querer apitar jogo. Jornalista também não pode. Torcedor tem que amar seu clube, não odiar o adversário e ficar disparando teorias conspiratórias sem comprovação pelas cada dia mais chatas redes sociais. Porque essa coisa do roubado é mais gostoso é nojenta.
E quem sabe na próxima rodada a gente possa falar mais de dribles, chutes, defesas e gols marcados com os pés e as cabeças.