segunda-feira, maio 28, 2012


Façam as suas teses



Futebol aceita qualquer tese, disse-me certa vez, com sua habitual sabedoria, o amigo Walter Casagrande Jr.

E brasileiro, quando se trata de futebol, adora uma tese. Se for conspiratória, melhor. Se for definitiva, melhor ainda.

Tem torcedor que adora vaticinar, na segunda rodada, que o time dele este ano será campeão e que o maior rival será rebaixado. Aí enumera uma série de fatores para defender a sua...tese, é claro.

Alguns colegas meus também gostam desse tipo de coisa. Mas acho que aí levam mais na brincadeira, na base do palpite, não da análise com argumentos.

Entre as teses que infestam as redes sociais feito praga está uma que é a favorita de alguns, a do bairrismo. Essa atinge diretamente a nós, jornalistas que escolhemos trabalhar na cobertura esportiva. As acusações são as mais variadas, mas basicamente residem no fato de que eles acham que falamos pouco e damos menos valor ainda ao time deles, só porque vivemos num estado diferente do deles.

Aí eu me pergunto, e eles se interessam pelos times dos outros estados, a não ser quando enfrentam o dele?

Então façam-me o favor! Menos com esse papinho ultrapassado, povoado de expressões ultrapassadas tipo times do eixo etc.

No primeiro semestre isso é um pouco mais forte, porque alguns não se dão ao trabalho de fazer algo que, reconheço, exige certo esforço de algumas pessoas: pensar.

Um exemplo. Minha base operacional é São Paulo. No primeiro semestre, o canal para o qual trabalho, o SporTV, transmite o Campeonato Paulista e a Copa do Brasil. Aí o sujeito diz que eu só falo de time de São Paulo. Uai, na maior parte do tempo no primeiro semestre eu só trabalho em jogos dos times de São Paulo.

Certa vez, em Porto Alegre, um dos lugares que mais gosto de visitar no Brasil e onde sou muitíssimo bem tratado, um torcedor educadíssimo me abordou em Praia de Belas. Disse que acompanhava o canal, respeitava todos, mas achava que nós éramos muito paulistas e cariocas, inclusive nos termos que usávamos.

Respeitosamente, argumentei assim:

- Meu amigo, aqui no Sul vocês falam goleira e casamata e eu nunca chamei de bairrismo. Aliás, sempre que aparecem esses termos quando trabalho, eu destaco a variação dos termos regionais no Brasil e reforço nossa riqueza cultural.

O meu interlocutor dos pampas ficou sem resposta. Resolvemos a questão tomando um café e lembrando de times históricos do Inter e do Grêmio para espantar o frio.

Raros são os casos de torcedores com cabeça mais aberta que reconhecem o valor de uma transmissão que fizemos nesta temporada, Bahia e Remo, para todo o Brasil, com o padrão de imagens e qualidade do SporTV. Felizmente, muitos torcedores dessas duas agremiações históricas reconheceram isso.

Mas não é esse o motivo do post. É tentar entender de onde sai tanta tese.

Até hoje tem gente que acredita que o Brasil vendeu a Copa de 98, por exemplo.

Outros adoram disparar teorias de que o time x fez corpo mole para derrubar o técnico porque perdeu na primeira rodada do Brasileiro. Ou, então, descobrem planos mirabolantes para reduzir o espaço de exposição de certa equipe na mídia por causa de motivos escusos. Meu Deus!!!!! Só para citar o amigo Milton Leite.

Acho espetacular a maneira como a maioria dos torcedores vê e sente o futebol no Brasil. Mas confesso que me assusta um certo aumento do fanatismo e da intolerância com o torcedor rival, com treinador, diretoria, jogadores e mídia.

Há uma revolta constante, por exemplo, contra o fato de jogadores de futebol ganharem bem. Mas essa revolta não se reproduz contra políticos que roubam, por exemplo. E sou capaz de apostar que a maioria dos torcedores que reclama dos salários dos jogadores não contribui em nada com o clube a não ser com a compra de ingressos em dias de jogos. Isso sem falar naqueles que entram de graça graças à conivência política de certas diretorias. Devem, inclusive, comprar camisa pirata.

Cada vez mais me convenço que brasileiro gosta pouco de futebol. Também acho que não gosta muito do time dele. Só gosta quando o time ganha.

Sei lá, é apenas mais uma tese.

6 comentários:

Molina disse...

Concordo em partes com o teu texto.

Realmente, teorias da conspiração é o que o brasileiro mais gosta.

Mas há de se ressaltar que existe uma certa tendência em comentários que são de certa forma imparciais.

Geralmente, quando um time que é de fora de um eixo joga contra um time que pertence a esse eixo, ele é tratado pela maioria dos comentaristas como se fosse o adversário na transmissão.

Concordo que os comentários dos jogos devem ser assim quando a transmissão dessa partida se dá de forma regional.

Agora, há muitos jogos com transmissão nacional que parecem se regionalizar nos comentários.

Já vi jogos no PFC com cobertura gaúcha que regionalizava demais para os times gaúchos. Não acho isso correto.

Concordo quando tu dizes que há teorias em excesso. Mas não podemos ser leigos ao ponto de dizer que não existe imparcialidade, e que a mesma não é, em muitos casos, externada para o telespectador.

Minha opinião.

Parabéns pelo bom trabalho!

FRANCISCO disse...

Nori,

Tudo no futebol é meio surreal. O narrador da TV que ganha para dizer o que é que meus olhos vêem; O treinador sem formação profissional, sem liderança e sem capacidade de comunicação; o jogador com salário desproporcional àquilo que produz.
O torcedor de futebol só é torcedor de futebol porque esta é uma atividade que não exige nenhum predicado, nenhuma qualificação. Quem quer torcer, torce para o time que quiser. Réu, advogado, meirinho, juiz e criminoso encarcerado podem comungar da mesma e democrática paixão clubística. Ninguém deixa de torcer pelo Flamengo, porque um jogador foi escoltado por criminosos; ou porque o matador, fingiu ser, literalmente, um matador, posando para fotografia, armado de fuzil, em companhia de traficantes; ou porque um atleta com uniforme do clube vem à TV perguntar "Quem nunca capotou um carro?" ou, ainda, "Quem nunca enfiou porrada numa mulher?". Daqui a pouco poderá haver jogador do Flamengo perguntando, na boa, "E quem é que nunca mandou matar e esquartejar a namorada?" e, ainda assim, haverá flamenguistas não-marginais.

Com relação ao bairrismo exarcebado tenho, também, minha TESE.
O "eixo" está para a Europa, assim como as demais regiões do Brasil estão para o "eixo". Da mesma forma que os clubes do Sudeste perdem seus melhores jogadores para os times europeus e montam elencos de barangas, os clubes do Nordeste e parte dos clubes do Sul entregam seus jovens promissores aos clubes do "eixo". Ou não foi este o caso do Ciro, do Osvaldo e de tantos outros?

Quando o Internacional de Porto Alegre e o Santos ganharam a Libertadores, tiveram o merecido destaque em jornais de esporte do continente. Se o Grêmio ganhar a Copa do Brasil, terá conseguido um feito nacional e terá destaque nacional. É muita pretenção querer que a imprensa de todo Brasil se sensibilize com um time medíocre formado, basicamente, com descartes de outras equipes: Pará, Gilberto Silva, André Lima, Gabriel, Léo Gago, etc.
TEM MÍDIA QUEM MERECE TER MÍDIA, o resto é baboseira.

FRANCISCO disse...

Nori,

Estive lendo sua matéria sobre critérios de arbitragem. Muito bacana! Fiquei contente em saber que há gente cuidando para que os árbitros sejam imparciais e justos. Óbvio que erros sempre haverá, o que não pode haver é má intenção, dissimulação e covardia.
Sim, porque o árbitro que mostra cartão ao atacante, apenas para justificar a não-marcação do pênalti é tão injusto, quanto covarde.
Cansei de ver o Neymar sofrer pênalti e o árbitro, além de não marcar a falta, apresentar cartão amarelo ao atleta do Santos. E, assim, criou-se a lenda do "cai-cai" e uma visão distorcida dos fatos: dar porrada pode, saltar para não tomar porrada não pode.
Vi uma outra orientação interessante: Se o jogador "A" empurra, sem violência, o jogador "B" e recebe, como resposta, uma cotovelada, por exemplo, apenas o jogador "B" deve ser punido. Lendo o parágrafo lembrei de um lance do jogo Corinthians e Santos, onde o Neymar aplica o chapéu no Chicão, com o jogo parado e é brutal e covardemente agredido pelas costas, caindo de cara no chão. O árbitro aplicou, corretamente, o cartão amarelo no Neymar, pelo deboche; mas, não aplicou qualquer punição ao jogador do Corinthians - e punição para agressão física é expulsão. E punição para árbitro covarde deveria ser exclusão do quadro de árbitros.

Anônimo disse...

Imparcialidade? Entendo que isso não existe. Todos temos nossos interesses. Todos somos influenciados. O que há, são comentaristas que procuram não ser parciais.
Mesmo no campeonato regional é bastante comum se ver comentaristas parciais. Isto também vale para os narradores.
O que eu gosto, mesmo, é de uma transmissão como Milton Leite e o Nori. Isso sim, dá gosto.

Isidoro

Molina disse...

Opa, no meu comentário, quando disse "imparcialidade" quis dizer "parcialidade".

Juliana disse...

É claro que os jornalistas de SP e RJ irão acompanhar os times desses Estados, porque os outros Estados têm os seus próprios jornalistas para fazer isso. O que ocorre é que os programas esportivos de melhor qualidade são veiculados a partir de SP e RJ e apresentados por pessoas desses Estados também, então existe a sensação de um certo desprezo pelos outros e torcedor fanático só ouve o que quer. É importante destacar também que nem todos são competentes e analisam profissionalmente os jogos, não se engane, nem todos são Mauricio Noriega! E isso cria certamente uma confusão nos espectadores que tendem a julgar com pre conceito narradores, comentaristas e apresentadores. Agora tese boa mesmo é acertar divergências ou compartilhar convergência com um bom café!