terça-feira, janeiro 31, 2012



Procuram-se ídolos

desesperadamente


Esporte e negócio cada vez mais se fundem, num processo irreversível. O esporte faz parte da indústria do entretenimento, da qual passou a ser protagonista. Grandes personalidades esportivas disputam espaço com estrelas da música, do cinema, da TV.

Um grande ator puxa bilheteria e até premiações para um filme teoricamente modesto. Uma grande banda pode vender milhões de cópias mesmo de um disco fraco. Muitas vezes um maestro midiático acaba chamando a atenção para uma orquestra que talvez não merecesse tanto.

O jogo hoje tem essas regras. O termo marketing é onipresente e, em certos casos, quem cuida dele nos dois lados do negócio se acha onipotente.

Os ídolos são fundamentais nesse processo. Eles puxam a venda de ingressos para jogos, espetáculos musicais e teatrais, alavancam a venda de produtos relacionados, tais como camisas de times, de bandas, cantores etc. Muitas vezes um clube de futebol fatura alto com a exploração da imagem de um jogador, assim como uma produtora cinematográfica pode ganhar mais dinheiro vendendo bonecos dos personagens de um filme do que com a história filmada propriamente dita.

No Brasil, em virtude de tudo isso colocado acima, nossos clubes de futebol e seus marqueteiros vivem procurando ídolos desesperadamente. Em alguns casos tentam até forjá-los ou exageram na avaliação. Como diz meu amigo e excelente jornalista e blogueiro Luís Augusto Simon, o Menom, o Deus Mercado aponta seu dedo para tudo e para todos.

Está cada vez mais difícil saber o que é verdade. A própria mídia, porque também se beneficia de ídolos, muitas vezes perde a sagrada isenção e acaba embarcando nesse processo, exagerando nos termos craque e herói, quando eles não se aplicam necessariamente.

Empresários super valorizam seus jogadores, tentando transformá-los em craques cobiçados por causa de meia-dúzia de boas atuações. Fala-se em propostas milionárias que chegaram, mas que não resistem a uma simples checagem.

Hoje em dia os clubes preparam festas cinematográficas para bons jogadores como se eles fossem mitos, semideuses. No caso de alguns retornos fica evidente essa forçação de barra. O São Paulo fez uma festa belíssima para Luís Fabiano, que tinha saído do clube meio pela porta dos fundos, e retornou com status de ídolo que talvez não tivesse tido tempo de construir. Se ainda fosse a volta de Raí em 1998, essa sim muito mais impactante, e Raí muito mais importante como atleta para o clube. Ou mesmo o retorno de Muller. Luís Fabiano é muito bom jogador, mas não é Raí.Nem jogando, nem vendendo.

Vágner Love no Flamengo é outro caso. Não se discute a qualidade do jogador, que é muito boa, embora ele esteja longe de ser craque. Mas seu rendimento anterior e sua história como atleta justificam tamanho frenesi? Ou seria uma forma de vitaminar ações de mercado, venda de camisas, obtenção de patrocínio etc?

Isso sem contar o investimento que os clubes fazem para repatriar esses jogadores, que voltam ao Brasil já em curva descendente na carreira e querendo ganhar salários de Europa pré-crise. O quadro que vemos hoje pinta uma realidade mais austera e menos barulhenta. As grandes camisas muitas vezes vão a campo por vários e vários meses sem exibir patrocínio máster. Quando o patrocínio é fechado, geralmente tem sido por valores abaixo do que se pedia.

Até com ídolos que superam a rivalidade clubística é difícil os clubes conseguirem grandes valores com ações de marketing e produtos. O Santos e o Palmeiras tentaram com bonecos de alguns jogadores e, embora houvesse algum sucesso, não foi nada de parar o trânsito.

Enfim, os clubes muitas vezes fecham negócios pagando salários estratosféricos para jogadores que tentam transformar em ídolos que talvez não sejam. Depois que o Corinthians apostou alto e se deu bem com Ronaldo, seus adversários achavam que fosse dar certo toda hora e que seria possível fazer jorrar ouro. Em alguns casos, por enquanto, parece mais ouro de tolo, principalmente com o próprio Corinthians no que se refere a Adriano. E Ronaldo é um só. Como atleta e como carisma.

Não me interessa quanto um atleta ganha de salário e tomara que todos recebam muito. Mas a relação custo/benefício e o que esse investimento traz de retorno para o clube, isso, sim, interessa. Quando leio notícias de jogadores pedindo 600 mil reais mensais e ainda exigindo bônus de produtividade, fico imaginando como os marqueteiros dos clubes tentariam obter retorno. Porque na maior parte dos casos fala-se de jogadores bons, no máximo muito bons. Não são craques, grandes ídolos, usinas de gols, títulos e retorno financeiro.

É preciso que os clubes brasileiros acordem do seu sonho de novo-riquismo enquanto ainda é tempo. Porque não faz sentido bater o bumbo e festejar contratações ao mesmo tempo em que se passa o pires pelo mercado ou não se consegue pagar salários em dia.

O negócio precisa de ídolos e eles realmente são bem vindos. Mas ídolos de verdade, não fabricados em reuniões de diretoria de marketing.

2 comentários:

Hiran Eduardo Murbach disse...

O boneco do Marcos vendeu muito. Mas ele foi o último ídolo... e provavelmente, por muito tempo (pra sempre?), continuará sendo.

tiago nery disse...

otimo texto. tenho me imprecionado com os salario que vejo falar. mas idolo mesmo so neymar no santos e rogerio ceni no são paulo. dois jogadores que ja deram grande retorno aos seus clubes