quinta-feira, julho 10, 2008

O FATOR VITÓRIA E A

TÁTICA NO FUTEBOL

Pego carona em mais um ótimo post do amigo Lédio Carmona em seu Jogo Aberto . Lédio discorre com a habitual competência e conhecimento sobre o surpreendente Vitória, sensação do Brasileiro.
Ainda não vi o Vitória jogar. O repórter Marco Aurélio Souza viu e me contou maravilhas sobre jogadores e, principalmente, o padrão de jogo, o sistema tático. Segundo o Marco, o time está mais para o padrão que vimos na Euro 2008 que para o jeitão brasileiro atual. Três atacantes, pontas, jogo rápido e não apenas concentrado nas laterais.
O Marco também disse que o Wagner Mancini, técnico do Vitória, se inspirou no que viu na Europa, no futebol mostrado por lá, e que teve a sorte de encontrar no Vitória jogadores com as características para jogar dessa maneira.
O tópico do Lédio leva a uma reflexão. Taticamente, penso o seguinte: o Brasil está parado numa fórmula que não se sustentará por muito tempo. Explico. O ataque nos times brasileiros, já há muito tempo, passa quase que exclusivamente pelos laterais. Isso provoca reflexos em todo o time. Para que os laterais ataquem o tempo todo, os treinadores adotam, geralmente, duas medidas. Uma é escalar um terceiro zagueiro. A outra é colocar, no mínimo, dois volantes marcadores para proteger a subida dos laterais. Isso sacrifica o meio-campo e tira dos times um meia de armação ou criação. O resultado são times óbvios, fáceis de serem marcados e anulados taticamente por equipes que tenham bons jogadores e treinadores inteligentes. Por isso me parece tão complicado para times brasileiros ganhar do Boca Juniors, por exemplo.
Isso também explica o momento ruim da Seleção Brasileira, pelo menos para mim. Como alguns dos "atacantes" são Maicon e Gilberto, Dunga opta sempre por um exército de volantes no meio-campo, para dar suporte às descidas dos laterais. O que trava o time, tolhe a criatividade e deixa isolados os atacantes de fato.
Esse é, para mim, o grande dilema do futebol brasileiro atual. Os times ficam esperando os laterais para atacar. Quando o adversário resolve fazer o que a boleirada chama de bater lateral com lateral, trava tudo. Com três zagueiros ou dois ou três volantes (não raro quatro) a coitada da bola fica perdida, e os atacantes, abandonados.
Na Europa essa questão parece mais bem resolvida. Peguemos como exemplo a campeã Espanha. Na minha análise, o time joga com uma linha de 4 (Sérgio Ramos, Puyol, Marchena e Capdevilla), o brasileiro Marcos Senna à frente dessa linha, uma segunda linha de 4 (Iniesta, Xavi, Fabregas e Davi Slva) e Fernando Torres à frente dessa linha. Iniesta pode aparecer (e muito bem) como autêntico ponta várias vezes, assim como Davi Silva, porque Sérgio Ramos e Capdevilla não precisam ser os atacantes do time. Capdevilla raramente passa do meio-campo. Xavi e Fabregas podem ser armadores, meias de fato, embora também ajudem na marcação. Marcos Senna protege a última linha de 4 e, com isso, a Espanha raramente sofre gols de contra-ataque. Tem mais consistência como time, flui melhor.
A vice-campeã Alemanha também faz a última linha de quatro, mas com um trio no meio-campo e outro trio à frente. Mas como o trio do meio tem apenas Ballack com qualidade de armação, é um time mais óbvio, embora seja muito ofensivo com o ótimo Schweinsteiger e Podolski. A Holanda usa Kluyt como ponta e tem Sjneider como um camisa 10 das antigas, armador de verdade. De ultrapassado na Europa apenas a retrancada França e a Itália, que sacrifica o taleto de Pirlo, fazendo com que ele precise voltar quase até a sua área para organizar o jogo, por pura falta de capacidade de Gattuso e Ambrosini, por exemplo.
No Brasil, quais são alguns dos principais armadores de jogadas de ataque, raciocinemos? No Flamengo fala-se quase sempre de Juan e Léo Moura. De Jorge Wagner no São Paulo. De Leandro e Élder Granja no Palmeiras. De Alex no Inter. O Fluminense, com Thiago Neves e Conca, tentou fugir um pouco disso, mas sempre se desafogava com Júnior César e Gabriel.
O resultado prático disso é que, na minha maneira de ver o jogo, os times brasileiros acabam sendo extremamente vulneráveis aos contra-ataques pelos lados do campo. Quase todos se recompõem mal e oferecem avenidas nas laterais para os adversários. Até meso time que jogam mais abertos, como o Palmeiras, que usa dois zagueiros e apenas um volante de marcação (Pierre), jogam demais a responsabilidade de levar o time à frente para os laterais. Mesmo tendo um talento como o de Valdívia. O Inter tem em Alex uma jóia rara, cada vez mais meia e menos ala, felizmente. O São Paulo anda travadão porque Joílson parece que ainda não se apresentou e Richarlyson anda em péssima fase. Sem armadores, sem bons meias, o time fica preso às ações dos alas e vulnerável no meio-campo.
Talvez seja a hora de, a partir das categorias de base, repensar o futebol brasileiro. Pegar o bom exemplo europeu e redefinir que lateral não precisa ser atacante. Que consistência não passa por uma tropa de volantes no meio-campo. Que adaptados à modernidade, os pontas podem ser resgatados. E, finalmente, que é no meio-campo que devem jogar os talentosos, os pensadores, os que organizam o jogo. Tipo o corintiano Douglas. Ainda é tempo de recuperar a vanguarda do futebol. Basta que os professores sejam menos professorais, que mais ex-jogadores de comprovada capacidade passem a trabalhar na base, ensinando fundamentos aos jovens e preservando a escola brasileira.
Tenho certeza que ainda existem pontas e bons meias pelo vasto território nacional. Se ao chegarem aos clubes eles não forem escravizados pela tática covarde e resultadista (citando Odorico Paraguaçu), não precisaremos ficar aplaudindo a ousadia do futebol europeu.

Um comentário:

Anônimo disse...

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