terça-feira, setembro 25, 2012



RÁDIO

 
 
Batuco essas linhas ao som de Radio Gaga, do Queen. Hoje é o Dia do Rádio. Não sou muito ligado nessas datas, em efemérides e coisas assim. Mas sou muito ligado em Rádio. Assim, em caixa alta. O rádio é, dos meios de comunicação, o mais companheiro. É aquele amigo que chega em casa, na cidade pequena do interior, puxa uma cadeira e engata aquela prosa longa, sem compromisso, que parece não ter hora para terminar.
 
O Rádio é o amigo que não liga apenas no dia do aniversário. Tem uma cumplicidade entre o Rádio e seus ouvintes que não existe, por exemplo, entre TV e telespectadores, entre jornal e leitores, entre Internet e navegadores. O Rádio conversa com a gente, a TV, exceto pelos grandes comunicadores (muitos deles egressos do rádio) meio que invade nossa sala, a Internet é xereta, e o jornal nos últimos tempos parece chegar sempre atrasado.
 
Eu sou ouvinte de Rádio desde que me entendo por gente. Recordo um Natal em que meus pais me deram um rádio de pilha da Philips, AM e FM, tons de cinza e preto, bem transado para a época. Devia ser lá por 1979, algo assim. Eu fiquei numa alegria só. Dormia com o radinho ao lado do travesseiro ouvindo "É Noite, Tudo Se Sabe", na Jovem Pan, com a voz insinuante de Ana Maria Penteado. O prefixo do programa era a canção-tema de Houve Uma Vez um Verão, de autoria de Michel Legrand.
 
Por influência do meu pai, que era muito amigo do genial Fernando Vieira de Mello, que é sinônimo de radiojornalismo, eu ouvia muito a Jovem Pan, cujo padrão de qualidade era reflexo do que pensava o Fernando. Sei de cor até hoje todas as velhas vinhetas da Pan, embora escute muito menos do que escutava e cada vez menos consiga ouvir a verdadeira Pan ecoando naquele prefixo.
 
Como esquecer do Fiori Gigliotti e suas maravilhosas peças de poesia nas tardes de domingo? Quando estava em férias em Bariri, perambulava pelos quatro cantos da casa da minha avó tentando encontrar um local em que a Bandeirantes entrasse sem interferência. Quase sempre, Lei de Murphy, na hora do gol a sintonia literalmente ia para o espaço. E dá-lhe caçar uma onda curta que tivesse mais firmeza!
 
Nas madrugadas lá na casa da Dona Olinda, eu me lembro que ela deixava o aparelho ligado e entrava cristalina a Tupi do Rio. Através daquelas ondas eu pude ouvir outro gênio da comunicação radiofônica brasileira, o Collid Filho e seu Salão Grenat. Ficava sabendo das notícias, dos resultados do futebol, e me impressionava quando a previsão do tempo dava a temperatura. Quando era inverno e as noites esfriavam no interior paulista, lá no Rio as madrugadas apontavam 25 graus. E o Collid falando como se estivesse tomando um cafezinho na sala. 
 
Ouvi muitas histórias da famosa Equipe 1040, da Tupi de São Paulo, que meu pai, Luiz Noriega, integrou, e que sob o comando de Milton Camargo e Pedro Luiz praticamente inventou o jeito de se fazer rádio esportivo que persiste até hoje. Quase tudo que se faz numa jornada esportiva do século XXI a 1040 já fazia nos anos 1960.
 
Percorrer o dial buscando, em ondas curtas, rádios de todo o mundo, tentando perceber estilos diferentes, sotaques, notícias, é um exercício fantástico. 
 
Isso sem falar nas FMs. Que alegria era poder ouvir um som mais potente, limpo, e conhecer grandes nomes da música, gravar uma fita K-7 para as namoradinhas que a gente sonhava e quase nunca conquistava. Hoje escuto muito as rádios que nos EUA são enquadradas do padrão AC, Adult Contemporary, e também as dedicadas ao rock, o que me faz lembrara da Fluminense, a Maldita, que introduziu uma geração ao bom e velho rock´n roll.
 
O Rádio do Interior, que segue firme, apesar da concorrência muitas vezes desleal das grandes redes, da TV e da Internet. Aquele Rádio que fala do baile no clube, da quermesse, da hora da Ave Maria, do sagrado horário sertanejo.
 
Como tudo e todos, o Rádio mudou. Houve um tempo em que para falar no Rádio era preciso ter uma voz capaz de capturar a atenção do ouvinte, que marcasse e identificasse seu proprietário. Hoje muitas vezes é difícil entender o que dizem algumas vozes no Rádio. Por isso admiro a Gaúcha, uma Rádio em que os comunicadores preservam a cultura da bela voz.
 
Gosto de ouvir as histórias de três grandes companheiros de transmissão do SporTV sobre o Rádio. Jota Júnior conta inúmeras dos seus tempos de rádio em Americana, em Campinas, na Gazeta, na Bandeirantes. Tempos em que o Rádio era o senhor da comunicação esportiva, que se fazia silêncio na sala, no carro, para ouvir a opinião de um Mauro Pinheiro, de um Juarez Soares. Milton Leite recorda suas peripécias do Show da Manhã da Pan, no qual ele, craque da comunicação, dizia que a Júlia, do Tatuapé, queria trocar um fogão e que a Márcia, de Interlagos, queria colocar uma TV no negócio. E Luiz Carlos Júnior lembra com carinho seus tempos de DJ e apresentador da Rádio Cidade, em Brasília, no Rio, lançando tendências e novas bandas.
 
Tive breves passagens pelo Rádio. Um pequeno período na Trianon, meio que como convidado, e um outro período, também breve, pela Bandeirantes. Guardo na memória a convivência com monstros sagrados como Muíbo Cury, José Paulo de Andrade, Salomão Ésper, José Nello Marques, Cláudio Zaidan. Escuto meu grande amigo Paulo Galvão e a simpaticíssima Thays Freitas carregarem o DNA da velha Band com grande competência.
 
Para fechar, lembro a vocação inabalável do Rádio, de prestar serviço, em dois momentos. Na votação das Diretas Já, lembro de todos em casa estarmos acordados, meu pai com o radinho de pilha na mão, esperando o resultado. Naqueles tempos estranhos, a sessão do Congresso foi fechada à imprensa. Quando acabou, lacônico, meu pai disse: "não passou. Agora vai dormir", e desligou. Meses mais tarde houve o famoso apagão na região Sudeste, muita especulação, gente falando em golpe, e o rádio informando, movido a pilha, mostrando caminhos para quem precisava sair de casa ou estava preso nos engarrafamentos.
 
O Rádio não tem um dia, tem a eternidade. Parabéns, companheiro!

sexta-feira, setembro 21, 2012



Oscar, Ganso e


futebol-negócio



Terminada a novela Ganso, chega a hora de tentar avaliar, cada um a seu modo, o que se aprende, ou se depreende disso tudo. Assim como é preciso trazer à tona outra novela recente, que tem um protagonista comum, o São Paulo Futebol Clube, a de outro meia talentoso, Oscar, agora do Chelsea.

O futebol está inserido no contexto do mundo atual, não é uma atividade que tenha regras próprias, isoladas e sobrevive como se ainda estivéssemos nos românticos anos 50. A palavra que dita os rumos do esporte hoje é negócio. Como uma das atividades que mais movimentam dinheiro na indústria do entretenimento, o futebol virou alvo de investidores de todo tipo. Milionários russos, ucranianos, árabes, empresários, ex-jogadores endinheirados etc.

Claro que o Brasil não poderia viver à margem disso. Acontece que por aqui, como as regras sempre são confusas quando se trata de negócios, e porque o futebol é formado em sua maioria por instituições pretensamente amadoras, ou sem fins econômicos, vira uma bagunça a mais.

Bagunça? Sim. Primeiro porque há ma confusão de interesses tremenda. Como são entidades sem fins econômicos, os clubes de futebol do Brasil, ou a maioria deles, não podem dar lucro porque não têm acionistas, proprietários ou investidores. Tudo que entra deve ser reinvestido o próprio clube. Endividados na maior parte do tempo, com seu poder de compra reduzido face à volúpia do mercado europeu, nos anos 90 e agora no século XXI os clubes brasileiros foram introduzidos meio que à força nessa nova ordem de negócios. Precisavam de dinheiro para contratar e, como não tinham, foram buscar "parceiros". Vieram empresas e pessoas sérias, outras nem tanto, houve casos de sucesso e de fracasso.

O velho passe foi dividido em duas novas modalidades, os direitos federativos e os direitos econômicos. Direito federativo é um nome pomposo para a boa e velha carteirinha do jogador, o registro dele como atleta pertencente a um clube. Os direitos econômicos é que se transformaram no x da questão. O jogador virou uma commodity, um investimento, que pode ser fatiado entre diversos investidores. Houve caso de jogador que atuava em um clube e tinha parcela dos direitos econômicos de um companheiro de time.

É preciso entender que o dinheiro não tem time. Geralmente tem pressa. Quem investe num jogador de futebol não vê diferença entre ele e um bocado de ações, um edifício, uma fábrica. Ao colocar seu dinheiro no negócio, o investidor espera retirar mais no futuro. Não é ilegal. Mas talvez não seja o modelo ideal para lidar com um atleta profissional.

Existe um mantra rodando por aí que afirma o seguinte: hoje o atleta joga onde quiser. Eu adaptaria para outra situação: joga onde seus investidores querem que ele jogue.

Como os clubes geralmente desconhecem as regras do mercado do qual são protagonistas, vira e mexe acabam tomando um vareio de empresários e acionistas.

Oscar protagonizou uma novela com o São Paulo e o Internacional. Acusações de toda parte, erros apontados aqui e ali, muitas justificativas. No final, ganharam de verdade o Chelsea, que ficou com um baita jogador, e o empresário ou agente de Oscar, que lucrou em todas as etapas da operação e certamente contabilizou lucros inimagináveis para qualquer outro tipo de operação financeira, em tempo recorde. Porque é isso que pretende um investidor do futebol, como qualquer outro investidor: lucro. Ele não faz filantropia, faz negócio. Em resumo: compra o talento do atleta e lucra com ele. Novamente, não é ilegal, mas pode-se discutir a moralidade disso tudo.

Com Ganso foi o mesmo. O Santos foi buscar um parceiro que não tem camisa, não tem estatuto, não tem passado, nem tradição. Tem um objetivo: lucrar. Como todos os parceiros do futebol. Como tem direito à maior fatia do bolo, o investidor não pensa em identificação, em compromisso, em torcida. Ele quer aproveitar a oportunidade de ganhar mais dinheiro do que investiu, no menor espaço de tempo possível. Principalmente quando aparece uma recessão no retrovisor.

A bola está, de novo, com os clubes. Eles demoraram a entender como funciona a nova engrenagem. Em muitos casos, times de enorme tradição chegaram a ficar praticamente sem jogadores "em estoque" porque não tinham mais direito econômico sobre eles. Foram fazendo parcerias, oferecendo a camisa para estocar atletas de empresários e quando despertaram, não tinham elenco, só as camisas.

Aos poucos isso vai mudando. Timidamente, os clubes de futebol brasileiros perceberam que, embora não possam ter o lucro como fim, é interessante investir nos direitos econômicos dos atletas novamente. Sempre mais espertos, os empresários saíram na frente e montaram times por conta própria, sem precisar recorrer aos intermediários, os times de camisa, que pensam em ganhar campeonatos. Essa é a questão ideológica. De um lado existem instituições que nasceram com viés esportivo, cujo lucro é vencer jogos, ganhar campeonatos e criar ídolos, história e identidade. De outro estão empresas que montaram times cujo objetivo principal é vender jogadores e multiplicar o dinheiro investido.

Os jogadores parecem ter entendido rápido que o lado do dinheiro é mais forte. Porque de bobos não têm nada. Sabem que sem eles não tem negócio. Hoje ganham muito mais do que seus colegas que jogavam há 15, 20 anos. Não concordo com quem os chama de mercenários. Se os clubes fossem mais organizados, inteligentes e não tivessem colocado a raposa no galinheiro, por pura incompetência, não existiria essa situação. O detalhe final dessa história é que no futebol muitas vezes fica difícil saber quem desempenha qual papel. Porque a impressão que fica é que em muitos casos a raposa é quem administra o galinheiro, ou que o dono do galinheiro é sócio da raposa.

Isso posto, é hora de pitaquear sobre Ganso no São Paulo. Se tiver condição física de exercer seu talento, ajudará muito a equipe. Como palpite não precisa de empresário, deixo o meu. Escalaria Ganso como um terceiro homem de meio-campo, jogando um pouco mais recuado, livre da obrigação de marcar, mas não tão próximo da área a ponto de ser obrigado a jogar de costas para a marcação. De frente, tendo o jogo diante dele, com Jádson entre ele e Luís Fabiano, acho que vai render bem.

segunda-feira, setembro 17, 2012



Plínio Marcos

 

bate um bolão





















Embora seja um arte tipicamente brasileira, o futebol quase sempre foi visto de um jeito meio marginal por artistas e intelectuais. Algo meio tosco, bruto...popular. Uma pena, porque temos inúmeros craques da bola e das artes. Felizmente, alguns deles se encontram e fazem arte.

Plínio Marcos talvez seja o mais boleiro dos dramaturgos brasileiros. Sua trajetória remete à daqueles craques improváveis, garotos que saem de um rincão perdido numa das esquinas do Brasil e, contra todas as probabilidades, transformam-se em grandes craques.

Pois Plínio Marcos criou-se dramaturgo como muitos jogadores criaram-se craques. Meio na raça, meio na sorte. Brotou das ruas, dos campos de várzea, da estiva, do circo. Por isso sua arte foi tachada de marginal por alguns preconceituosos. Era autêntica, popular, surgia do asfalto, da luta pela sobrevivência, não de salões perfumados ou círculos acadêmicos restritos.

Cronista inspirado do cotidiano, Plínio Marcos completaria 77 anos em 29 de setembro, mas foi vítima de um derrame cerebral em 29 de novembro de 1999. Além de obras fundamentais do teatro brasileiro, como Barrela, Dois Perdidos Numa Noite Suja e Navalha Na Carne, deixou uma vasta obra como jornalista e cronista. Escreveu - e bem - sobre o futebol, uma de suas paixões, manifestada por um amor sincero e pouco comum pelo simpático Jabaquara, de Santos, o Jabuca.

Uma dessas almas iluminadas que conseguem vislumbrar arte e teatro no futebol, a atriz e produtora Graça Berman assume o desafio de entrar em palco para propor esse jogo. Contou com graça e leveza a história da cidade de São Paulo e dos seus principais times de futebol, em ritmo de samba enredo, na saborosa montagem "Nos Campos de Piratininga".

Agora resolveu arriscar um jogo mais denso e mostrar a aguda percepção social das crônicas e reportagens futebolísticas de Plínio Marcos, aproveitando para homenagear a obra e celebrar a vida do dramaturgo e escritor.

Em "A bola da vez: Plínio Marcos", Graça Berman e sua Cia. das Letras trafegam com entrosamento e competência do drama à comédia, com pitadas de música. O texto usa quase que integralmente trechos de crônicas de Plínio Marcos publicadas em jornais e revistas de grande circulação, misturando personagens reais a criaturas de ficção.

O elenco veste a camisa (com o perdão da redundância) com garra e versatilidade. Décio Pinto, Ana Arcuri, Fabricio Garelli, Gira de Oliveira, Jota Barros, Ricardo Pettine e Tania Luares fazem valer o preço do ingresso, aliando experiência e juventude num time afiado. Dá vontade de voltar aos textos e à montagens de Plínio Marcos, o que não é pouca coisa.

Como já é tradição nas montagens futebolísticas da Cia. das Letras, nas sessões das quintas-feiras acontecem debates após o espetáculo, reunindo atores, jornalistas, técnicos e jogadores de futebol.

Ficha técnica

Direção e Texto: Graça Berman
Assistente de Direção: Guilherme Motta
Elenco: Décio Pinto, Ana Arcuri, Fabrício Garelli, Gira de Oliveira, Jota Barros, Ricardo Pettine e Tania Luares.
Iluminação: Davi de Brito
Trilha Sonora: Raul Teixeira
Preparação corporal: Augusto Pompeo
Percussão Corporal: Ronaldo Santos
Preparação Vocal: Tato Fischer
Cenografia, figurinos e adereços: Kleber Montanheiro
Administração: Maria Alice Gouveia
Produção Executiva: Claudete Pontes
Marketing Digital: Joaquim Machado
Programação Visual: Edu Reyes
Assessoria de Imprensa: BBP Comunicação

A bola da vez: Plínio Marcos
Duração: 90 minutos
Classificação indicativa: 13 anos
Período: até 12 de outubro.
Horário: quinta e sexta-feira, 21h
Ingressos: R$50,00, R$25,00 e R$20,00 (para torcedores vestindo a camisa do seu time)
Local: Teatro Maria Della Costa
Rua Paim, 72 São Paulo – Telefone (11) 3231-4725

sexta-feira, setembro 14, 2012



Felipão, débito e crédito



Não é toda hora que um técnico de futebol que já ganhou a Copa do Mundo fica sem emprego. Pouco importa a dinâmica do processo, se pediu para sair, se saíram com ele, o fato é que Felipão saiu do Palmeiras.

É notícia de repercussão mundial e que sugere uma série de análises.

Felipão é um treinador consagrado, vencedor, com carreira estabelecida. Por isso é um profissional caro, que faz muitas exigências, respaldado por seus resultados. Quem aceita pagar esse custo espera que o retorno venha em forma de conquistas.

Até aí, tudo normal. O que pega é quando se coloca o nome Palmeiras na frase. Felipão não é apenas mais um técnico para o Palmeiras. Como não é Luxemburgo, como não foi Brandão. Felipão é verbete de destaque na enciclopédia palestrina, daqueles com direito a foto e mais de uma página de texto. É dos poucos treinadores a ter alcançado a estatura de ídolo.

No caso de um clube cujo pensamento político e futebolístico se perdeu em algum momento entre os anos 60 e 70, essa relação de idolatria é terreno pantanoso. Incapazes de administrar o gigante vitorioso que herdaram, os dirigentes palmeirenses pedem socorro a treinadores que eles consideram como salvadores da pátria. Capazes de, não apenas treinar um time, mas de gerir um deparamento de futebol. Porque é assim que as coisas funcionam no Palmeiras desde o fim da fantástica experiência de co-gestão com a Parmalat.

Tanto que entre 1977 e 2012 o Palmeiras ganhou muitos títulos de expressão. Todos eles tendo à frente apenas dois treinadores: Felipão ou Luxemburgo. Basta levantar o número de treinadores que conquistaram títulos com os rivais de cidade Corinthians e Palmeiras e um observador minimamente atento perceberá que o problema não é só técnico. Mas o problema também foi o técnico. Felipão tem crédito e tem débito, como qualquer profissional. Mas é preciso cobrar da conta dele apenas o que ele consumiu.

Em geral, em pouco mais de dois anos de trabalho, Felipão não teve um grande desempenho. Chegou a duas semifinais, uma estadual e uma continental (perdidas), e a uma final nacional (conquistada). No Brasileirão esteve sempre ali no meio da tabela - até despencar neste ano.  Em termos de qualidade futebolística, o Palmeiras de Scolari jogou bem no Paulistão de 2011 e na Copa do Brasil de 2012. Fora isso, foi um time esforçado, lutador e limitado tanto na questão tática como na técnica.

Quem contrata Felipão sabe que com ele vem um pacote de atitudes e comportamentos. Embora seja hoje um cidadão do mundo da bola, o treinador muitas vezes ainda acha que a vida é um grande Gre-Nal e quem não for com ele estará contra ele. O conflito sempre foi usado por Scolari como uma ferramenta de trabalho, um artifício motivacional.

Estrategicamente, sempre foi um técnico que privilegiou a defesa. Seu pensamento futebolístico é conservador. O que não significa falta de coragem em situações pontuais. Mas vendo seus times em campo percebe-se claramente que a primeira regra é não perder. Talvez por isso em algumas situações eles sofram tanto para ganhar. Em várias situações, segurou sozinho a enorme incompetência dos dirigentes palmeirenses. Mas em outras mereceu o crédito pelos insucessos.

Olhando de longe fica claro que ele e o Palmeiras perderam o tempo de tomar uma decisão que talvez tivesse sido a melhor para ambos. Decisão difícil de se tomar, que requer coragem e sangue-frio. Quando ganharam a Copa do Brasil, Palmeiras e Felipão poderiam ter encerrado de forma amigável, por cima, a parceria. Talvez fosse até o desejo do treinador. Seu estafe aguardava, naquela época, um convite para dirigir a seleção da Rússia, que nunca veio.

Parece fácil escrever agora, mas uma conquista como aquela, num cenário que previa o fim do contrato em dezembro, pode ter mexido com a cabeça de técnico e dirigentes. Porque o Palmeiras ganhou, e com méritos, mas foi um presente dos deuses do futebol. Uma trégua em meio a uma série de insucessos, problemas e falta de visão de futuro. Talvez embriagados pela vitória, Palmeiras e Felipão pensaram que poderiam fazer mais do que realmente podem hoje. Por isso mudaram um curso que, nos bastidores, parecia traçado: Felipão querendo treinar uma seleção na Copa de 2014 e o Palmeiras querendo um técnico mais barato.

Porque o elenco palmeirense não permite a treinador algum grandes arroubos. Embora permitisse uma situação mais confortável, que não veio, também, porque Felipão desde que chegou não conseguiu dar consistência defensiva (a base de seu conceito de futebol). Exceto no breve período da reta de chegada da Copa do Brasil. Vitoriosos, clube e técnico passaram a planejar voos mais altos do que poderiam. Libertadores, grandes contratações, um esquadrão. Enquanto isso, a dureza da realidade batia no fundo das redes do goleiro Bruno a cada rodada.

Felipão e o Palmeiras certamente reencontrarão suas trajetórias de sucesso no futebol. Talvez um demore mais do que o outro. Não sei dizer em que ordem. Mas para isso precisam entender e admitir suas parcelas de culpa na hora de pagar a conta. O Palmeiras precisa lembrar que não é mais time da colônia italiana faz uns 50 anos. E Felipão tem que saber que o tempo em que ou se era chimango ou maragato hoje está nos livros de história.

quarta-feira, setembro 12, 2012



A arte de convocar



Não é nada fácil a vida de um treinador de seleção. Em qualquer parte do mundo, em qualquer esporte. Imagine no Brasil e no futebol.

Conversei com inúmeros treinadores de quase todos os esportes durante minha carreira e quase todos eles falaram desse drama na hora da convocação. De como a certeza muitas vezes se transforma em dúvida. De como é difícil avaliar o momento de um atleta e compará-lo ao histórico da carreira.

Pior que a convocação, confirmam todos, é o corte. Nenhum técnico gosta de cortar atleta. Fica sempre a questão humana pairando sobre uma atitude técnica. Fora a dúvida, inevitável, ao optar por atletas muitas vezes da mesma capacidade técnica.

Quando se trata de seleção brasileira de futebol, a convocação é um assunto que, mesmo hoje, com a seleção meio em baixa no gosto do povo, palpita. Todo mundo tem sua seleção, escolheria de uma forma. Dificilmente se encontrará uma mesma seleção se for feita uma pesquisa com cem, 200 torcedores.

Além disso, a convocação mexe com a paixão clubística. Hoje mais se reclama do que se comemora uma convocação de jogador. Porque com os problemas do calendário, um jogador convocado para a seleção atrapalha seu time, deixando-o desfalcado em jogos importantes. Mesmo assim, torcedores reclamam  a ausência de determinados atletas das listas de Mano Menezes.

Convocar é uma arte. Porque envolve algo que deve estar acima das opções pessoais de quem convoca, que é o coletivo.

Treinadores vivem de suas convicções. Os melhores geralmente são aqueles que acertam mais em suas, digamos, certezas. Mas também são os que não têm medo de reconhecer quando suas convicções caminham contra as evidências.

Outra questão complicada é a administração do grupo. Em se tratando do futebol, um universo povoado de atletas mimados, super estimados e em muitos casos mascaradíssimos, fica ainda mais difícil fechar a conta. Será que vale a pena levar uma super estrela, que certamente contaminará o vestiário, mas tem condições de resolver uma partida em uma ou duas bolas? É possível controlar os egos ao ponto de que em um período curto, como uma Copa do Mundo, eles sejam deixados de lado?

Cobri muito a seleção brasileira em minha carreira e confesso: o ambiente nunca me seduziu. Cria-se uma espécie de vínculo que, embora ajude na busca por informações, pode atrapalhar na procura pela isenção e objetividade. Também existe uma grande confusão entre cobertura jornalística e torcida. Principalmente em época de Copa do Mundo.

Jamais existirá uma convocação que agrade em 100%.

Eu, assim como quem está lendo esse texto, todos temos nossas preferências. Por exemplo, eu convocaria Fred e Diego Cavalieri, e não convocaria Carlinhos e Fábio Santos. Mas acho que chamar jogadores jovens e talentosos como Bernard é importante nesse momento de transição.

Se há algum problema pessoal entre treinador e algum jogador, a hora de resolver isso é agora.

Fred declarou publicamente que Mano Menezes não gosta de seu trabalho. Fosse eu o Mano, e no caso de o treinador entender que Fred é útil, convocaria e na apresentação chamaria para o cantão, como se dizia antigamente, e acertaria tudo cara a cara. Para não deixar dúvidas.

Num grupo de 25, 30 pessoas, principalmente formado por gente que ganha muito dinheiro e é bajulada todo o tempo, será impossível satisfazer a todos. Mas é fundamental deixar claro que o critério é somente técnico e pode até ser cometido algum erro, mas jamais uma injustiça.

quinta-feira, setembro 06, 2012



Futebol e cidadania


Como esporte mais popular do Brasil (e do mundo) o futebol exporta tendências, cria ídolos, levanta e derruba reputações. Movimenta paixões, diverte, entristece, emociona. Enfim, está inserido em nosso contexto como País, como Nação.

Não trata-se de uma postura politicamente correta, mas de um alerta, de um grito. As pessoas que estão envolvidas com o futebol, sejam elas jogadores, treinadores, dirigentes, jornalistas e torcedores precisam entender que esse jogo apaixonante faz parte de um contexto maior, que envolve o conceito de cidadania.

Nesse aspecto, nosso futebol está passando um péssimo exemplo para as futuras gerações. Sob o pretexto da competitividade, da luta pela vitória e da sede por conquistas, assistimos a um festival de simulações, de tentativas descaradas de enganar o adversário, o torcedor que vai ao estádio e o que assiste aos jogos pela TV.

O artifício que o atleta profissional de futebol tem para "enganar" o adversário é o bom e velho drible, esse instrumento lúdico e que anda meio fora de moda. Fazer um gol com a mão disfarçadamente, tentar "cavar" um pênalti, espernear pedindo uma falta que não houve, tudo isso deixou de ser moda, se é que foi um dia, há muito tempo.

A prática do jogo violento, do chamado antijogo, da cera, o desrespeito a horários e a regras, tudo isso contribui para que o ambiente de uma partida de futebol ganhe em tensão e perca em divertimento.

O futebol anda junto com a sociedade. Como aceitar que uma Nação que se manifesta dia-a-dia enojada com a montanha de corrupção, a dose cavalar de violência e uma desigualdade social sem tamanho entenda como normal o comportamento que parece ter tomado de assalto nossos gramados?

Reforço que não estou levantando a bandeira do politicamente correto. Acho que num campo de futebol o palavrão é elemento presente e aceitável, uma troca de provocações, uma entrada mais ríspida, tudo isso faz parte do contexto do jogo.

O que não se pode aceitar mais é que se chame de ladrão e safado o juiz que erra contra o seu time e que se fique calado quando ele erra a favor. É impossível seguir admitindo, com o futebol servindo de vitrine, de instrumento de inclusão e ascensão social, que um atleta tente transformar um choque permitido pela regra em uma suposta agressão, que num lance em que sequer foi atingido tente forjar uma contusão grave.

Torcedores que um dia sugeriram que seu time entregasse um jogo para prejudicar um rival podem, por exemplo, acusar um jogador de ser mercenário?

Enfim, é um conceito de cidadania. O futebol pode ajudar, e muito, a melhorar esse País, desde que seus dirigentes, jogadores e torcedores, e nós, jornalistas, todos adotemos uma postura mais séria, direta e que reflita os anseios de um povo.

Parece discurso vazio, mas pode ajudar a fazer a diferença. Um grande craque que, ao pendurar as chuteiras, segue sua vida como um grande cidadão, fará muito mais por toda a sociedade do que as muitas alegrias que deu aos torcedores.

quarta-feira, setembro 05, 2012



Mistérios da China


*produção do nobre Edgar Alencar



Muita gente morre de rir quando um jornalista que atua como comentarista esportivo fala que vai estudar. Pois é isso mesmo, a gente estuda antes do trabalho. Procura e checa informações, assiste jogos, dispara telefonemas em busca de alguns detalhes.

Estava estudando para comentar Brasil x África do Sul e Brasil x China, amistosos dessa insossa seleção brasileira atual. Como, por efeitos da escala, não comentarei mais Brasil x China, achei que poderia pelo menos contribuir com algo da pesquisa. Na busca por informações acionei um querido amigo e colega de trabalho, o excelente repórter Edgar Alencar, correspondente do SporTV na China e profundo conhecedor dos mistérios do Oriente.

Nosso nobre Ed, goleiro dos bons e observador atento do futebol, trouxe algumas valiosas informações, as quais compartilho com os leitores do blog.

O time chinês, treinado pelo espanhol José Antonio Camacho (treinador de uma era em que a Espanha não era a potência atual), tem como base o Guangzhou Evergrande, time que tem jogadores brasileiros como Muriqui, Paulão e Cléo, e o argentino Conca, além do treinador italiano Marcelo Lippi. A equipe chinesa empatou recentemente com Gana por 1 a 1, em amistoso no qual o apito amigo contribuiu sobremaneira para o resultado.

O grande nome da seleção chinesa é o atacante Gao Lin, também do Evergrande. Sua marca registrada, além do futebol acima da média para o padrão chinês, é a mania de pintar os cabelos com cores chamativas. Segundo nosso repórter Edgar Alencar, Lin atua mais como segundo atacante, embora na seleção muitas vezes jogo como referência, fazendo o trabalho de pivô.

Zheng zi é outro atleta do Evergrande que se destaca na seleção da China. Ed pontua que ele atua ora como zagueiro, ora como volante, e é o capitão da equipe.

Edgar Alencar produziu um SporTV Repórter sofre o futebol chinês, que deve ir ao ar em 22 de setembro, no qual entrevistou o espanhol Camacho, encarregado de dar uma nova cara ao futebol chinês. Camacho disse que a maior deficiência do time é a roubada de bola. Falta agressividade na busca pela recuperação da redonda, segundo o treinador, o que torna o time pouco competitivo.

Ou seja, mais um adversário escolhido a dedo para conseguir uma vitória providencial, que alivie um pouco as críticas e acrescente quase nada ao trabalho de formação de uma nova seleção brasileira.

Sobre a África do Sul, dá para adiantar que há uma tentativa de renovação, ainda que tímida. Principalmente porque foram chamados sete novos jogadores, mas ainda há oito remanescentes do time que disputou a Copa de 2010, quatro deles que retornam à seleção de maneira algo surpreendente, pois não vinham sendo convocados regularmente.