quarta-feira, julho 06, 2011

A camisa da seleção

não tem proprietário


Reproduzo minha coluna publicada terça no Diário de S.Paulo.


O empate com a Venezuela não precisa desencadear uma crise ou uma revolução na modorrenta seleção brasileira da estreia na Copa América. Longe disso. Mas bem que proporciona uma oportunidade de ouro para Mano Menezes incorporar de vez o papel de comandante da equipe e mostrar ser ele quem manda. Algo como chegar ao vestiário, dar um bico na mesa e gritar: aqui é seleção brasileira, meu filho!




Até aceito que um técnico de seleção conte com seus homens de confiança. Mano tem Lucas como seu representante no campo e o volante jogou bem contra os venezuelanos. Mas quem assume o comando de um time como o Brasil precisa estar apto a dar um grito de liberdade, a chutar o balde, como se diz nas ruas, e provar que a camisa cinco vezes campeã mundial não tem proprietários.



Jogador de futebol é malandro por natureza. Até para sobreviver em um meio que é uma selva. Contra a apenas esforçada Venezuela, Mano teve uma chance de ouro de mostrar que, teoricamente, é o único a ter cadeira cativa até 2014.



É algo muito mais psicológico, de liderança, do que futebolístico. Obviamente, Ganso e Neymar são craques, titulares da seleção. Mas jogaram pedrinha no domingo e mereciam ter saído do time. Antes de criar uma crise, Mano daria um recado simples, direto: se não jogarem, tem mais gente ali fora babando por uma chance. Não é um ato definitivo, mas de uma sutileza de momento.



O mesmo princípio vale para Robinho. Ainda que tenha jogado bem no Milan, na seleção, Robinho é aquele que foi sem nunca ter sido. Jamais cumpriu a promessa de ser um craque decisivo, imponente. Não pode se dar ao luxo de reclamar porque sai sempre, pois não tem jogado para justificar cadeira cativa.



Mano é bom treinador, inteligente, atualizado. Merece crédito. Mas possui em seu grupo nove jogadores da campanha da Copa de 2010. É muita sombra para um processo de renovação, para um estágio de mudança de gerações.

E mais do que um parceiro dos jogadores, o técnico da seleção brasileira precisa ser um executivo capaz de se impor diante de jovens milionários e badalados, mostrar ser ele quem manda. Nem que seja para chacoalhar certas acomodações e soberbas que, de vez em quando, ficam evidentes.



Santa desorganização

Se há algo em que nós, sul-americanos, somos absolutamente iguais é na desorganização. Nada parece funcionar direito quando se tenta organizar algo em nosso continente. Encontrar uma vaga de estacionamento é um parto. A zona mista de entrevistas parece zona de guerra. Ainda há tempo para melhorar.



Escala de folgas

Os empates de Argentina e Brasil tiveram pesos diferentes para as respectivas comissões técnicas. A argentina cancelou a folga programada para o sábado e enclausurou os atletas na concentração de Ezeiza. A brasileira manteve o descanso de ontem, o que deve ter aliviado os jogadores do isolamento em Campana.



Copa América

As notícias do rebaixado River Plate (foto à esquerda) e a estátua feita pelo Boca para Riquelme são dois temas que ofuscaram o torneio. E na sexta-feira, enquanto a seleção local jogava contra a Bolívia, milhares de argentinos celebravam o centenário do modesto Nueva Chicago, da Terceira Divisão, no Obelisco de Buenos Aires.



Nó tático

Não é fácil ser Messi na Argentina. Embora as vitrines das lojas de artigos esportivos ? inclusive os pirateados ? estejam tomadas por camisas branca e celeste que levam o nome do craque do Barcelona, é difícil encontrar alguém que as esteja vestindo.



Messi é quase um estrangeiro em sua própria terra. Foi aos 13 anos para Barcelona e lá se fez jogador. Não vestiu camisa de time argentino, não criou raízes, identidade, tampouco rejeição. A ponto de ser Tevez ? e não ele ? o craque considerado o jogador do povo pelos compatriotas.



A camiseta argentina parece sempre apertada, desconfortável em Messi. Não veste bem como a azul e grená do Barça. Não existe, ainda, aquela cumplicidade demonstrada com Xavi, Iniesta, Villa.



É um processo razoavelmente conhecido pelos brasileiros, que se acostumaram, nos últimos anos, a ver jogadores vestirem a camisa da seleção nacional, mas com pouca ou nenhuma conexão com a alma que ela simboliza.

Messi é cracaço de bola, tem tudo para liderar a Argentina rumo a uma bela campanha nesta Copa América, mas parece ainda não ter optado pela nacionalidade argentina como jogador de futebol. Tem chance de pedir a documentação a partir de amanhã, no confronto decisivo contra a Colômbia, em Santa Fé.

Um comentário:

Anônimo disse...

Meu caro Maurício Noriega, bom dia.


Primeiramente, quero dar-he parabéns, ainda que atrasados, mas sinceros, por seu aniversário na semana passada. Saúde, Paz, Amor, Fartura.

Em segundo lugar, para dizer que não sou tão das antigas, mas tenho como uma das melhores lembranças de minha juventude, a narração emblemática de seu pai, Luiz Noriega com os comentários de Orlando Duarte, pela TV Cultura de São Paulo. Boníssimos tempos.

Considero-o um dos melhores, senão o melhor, mais ponderado comentarista da TV, entretanto, entendo que suas críticas ao Neymar e ao Ganso contêm um grande exagero.

Prefiro ter em campo quem estiver "jogando predrinha", para usar sua expressão, mas que pode jogar um "Everest" a qualquer momento, do que manter em campo ou mesmo colocar quem joga pedrinhas o tempo inteiro, principalmente num gramado de extensão acanhada e piso mas apropriado para a prática de hóquei sobre elefante.

Uma outra crítica que faço a TODOS os jornalistas é sobre chamarem o tempo todo o Messi de "melhor do mundo".

A informação é, no mínimo, incompleta, já que dito atleta foi eleito "no ano passado"; o melhor do mundo atualmente será conhecido somente no final do ano, de modo que esse é o complemento mínimo que a badalação ao estrangeiro carece.
Por falar em jogar pedrinhas...e não vejo ninguém dizendo que ele tem que sair do time!

Como diz o ditado, caro Maurício, a galinha do vizinho sempre põe ovos mais bonitos que a nossa.

Assim caminha a humanidade.

Abraço e felicidades.


Luiz Tomaz